Juíza aplica multa por litigância de má-fé em recuperação judicial com indícios de fraude
Fonte: Consultor Jurídico
Devido aos indícios de esvaziamento patrimonial, gestão fraudulenta e falta de
atividade regular, além da tentativa de induzir a Justiça a erro, a 2ª Vara Regional
de Competência Empresarial e de Conflitos Relacionados à Arbitragem de São
Paulo extinguiu o pedido de recuperação judicial de uma rede de supermercados
e condenou o grupo a pagar multa de 10% sobre o valor da causa por litigância
de má-fé.
Juíza viu indícios de esvaziamento patrimonial, gestão fraudulenta e falta de
atividade regular da rede de supermercados
De acordo com a defesa de uma credora no processo, a multa é de
aproximadamente R$ 10 milhões.
A credora em questão informou à vara empresarial que, em outra ação, a rede
devedora já foi reconhecida pela 4ª Vara Cível de Santos (SP) como um grupo
econômico fraudulento, formado por diversas empresas sob gestão unificada.
A juíza Andréa Galhardo Palma havia determinado a elaboração de um laudo
de constatação prévia para verificar as condições da empresa devedora e a
regularidade da documentação apresentada. Após a conclusão do laudo, a rede
de supermercados apresentou a desistência do pedido de recuperação.
Na visão da julgadora, isso representou uma “clara tentativa de induzir este
juízo a erro”, já que o laudo havia revelado as irregularidades.
O grupo não comprovou ter cumprido todos os requisitos necessários para
pedir a recuperação judicial, nem mesmo o exercício regular da sua atividade
empresarial nas diversas unidades.
Conforme o laudo, alguns documentos tinham inconsistências, grande parte
dos estabelecimentos não funcionava e havia indícios de manipulação e
direcionamento de recursos financeiros para a pessoa física de um sócio.
Lista de problemas
Nem todos os balanços patrimoniais e demonstrações do resultado de 2023,
por exemplo, tinham a assinatura do sócio administrador. Os demonstrativos
com a relação dos credores, seus respectivos créditos e outros detalhes estavam
incompletos. E não foi apresentada a lista detalhada dos débitos fiscais do
grupo.
Mesmo intimadas mais de uma vez para apresentar a documentação pendente,
as empresas nada fizeram.
De acordo com Andréa Palma, o laudo também mostrou “a existência de
confusão patrimonial e administrativa entre empresas formalmente distintas,
revelando indicativos sérios de atuação deliberada voltada à ocultação
patrimonial e burla aos direitos dos credores”.
Na sua visão, o pedido de recuperação foi usado como “instrumento artificial
para blindagem de patrimônio, diante da insolvência gerada por atos de
confusão patrimonial e desvio de ativos entre empresas do mesmo grupo”.
Para ela, isso “compromete a integridade da função jurisdicional e atenta contra
a dignidade da Justiça”. A juíza considerou que houve “tentativa de
instrumentalização do Poder Judiciário com propósitos espúrios, configurando
abuso do direito de ação e conduta temerária”.
A litigância de má-fé, segundo a julgadora, ocorreu também pela “alteração da
verdade dos fatos” e tentativa de “obtenção de tutela jurisdicional incompatível
com a realidade fática e documental apresentada”.
Marcelo Naufel, advogado da credora que apontou as irregularidades, diz que
decisões como essa moldam o futuro da recuperação judicial, “exigindo maior
rigor na apresentação de documentos, preparação do seu corpo técnico e na
comprovação da real situação da empresa”.
Processo 1013630-96.2024.8.26.0477